O verso “estava machucado, ferido, não podia dizer o que sentia. Estava irreconhecível para mim mesmo” abre a canção “Streets of Philadelphia”, que deu o Oscar de melhor música para Bruce Springsteen. O filme deu a estatueta a Tom Hanks pela primeira vez, melhor ator.
Esse trecho descreve mais ou menos como chegarão palmeirenses e botafoguenses ao Berço da Liberdade. A Filadélfia é o lugar onde foi redigida a declaração de Independência dos Estados Unidos e assinada a Constituição.
O Palmeiras chega ferido pela má atuação contra o Inter Miami. O Botafogo, pela primeira derrota, contra o Atlético de Madri, que o retirou da liderança do Grupo B, o mais difícil da competição.
O Berço da Liberdade será invadido por duas das torcidas que se fizeram notar nos estádios.
Antes de o Flamengo entrar em campo contra o Los Angeles, em Orlando, ostentava média de 40.208 espectadores em suas partidas, contra 47.456 palmeirenses e 35.614 botafoguenses. O Boca tem 59 mil, o Real Madrid, 66 mil.
Não há “hinchada” mais vibrante do que a do Boca Juniors na Copa do Mundo de Clubes. A do Palmeiras vem logo atrás.
Festejam ser Palmeiras, mesmo quando se incomodam com o desempenho do time. A mesma lógica vale para o Botafogo. A trupe da qual participam os atores Hélio de la Peña e Maurício Meirelles espalhou alegria pelas arquibancadas de Los Angeles, antes de chegar à Filadélfia.
Além de berço da Democracia, a Filadélfia tem larga tradição em torcidas esfuziantes. A dos 76ers, na NBA, é considerada a mais vibrante da modalidade, embora rivalize com Sacramento Kings e Boston Celtics. São 76ers em referência à independência, 1776.
Vencer também é com os nativos da Filadélfia, como os Eagles, últimos vencedores do SuperBowl. Entre os que querem vencer, mais motivos para acreditar nos botafoguenses. Dos últimos seis jogos contra o Palmeiras, venceram três, dois deles no Allianz Parque.
Derrota só na épica virada palmeirense, com show de Endrick, autor de dois gols nos 4 x 3 que iniciaram o debacle botafoguense no Brasileiro 2023.
Crença na virada, no impossível, as duas torcidas têm. Há doze anos, o Corinthians era campeão mundial e o Palmeiras estava na Série B. Hoje, imponentes, os verdes estão no SuperMundial e os corintianos na página policial.
O Botafogo está na Copa do Mundo de Clubes apenas quatro anos depois de vencer a Série B, com as arquibancadas celebrando o meia Chay.
Em tom de deboche, diziam: “Meu avô se gabou ontem com meu pai, que viu Garrincha, Maradona, Pelé, Cruyff e tudo mais. Desculpa, pai! Eu vi o Chay.”
Há pouco tempo, palmeirenses e botafoguenses estavam machucados, feridos, não podiam dizer o que sentiam. E era por motivo muito mais duro do que ter jogado mal a última partida. Eram anos de esperança numa mudança de rumo, que enfim veio, como no sonho de liberdade simbolizado pela capital da Pensilvânia.
Palmeiras e Botafogo estiveram irreconhecíveis para eles próprios na segunda-feira, um em Miami, outro em Los Angeles. A Filadélfia será, no sábado, o berço da esperança para perto de 50 mil pessoas que encherão as arquibancadas do Lincoln Financial Field.