Como é correr 10 km descalço – 29/09/2025 – No Corre
Há cerca de 15 anos, o último trend da indústria de tênis era o minimalismo. Influenciadas pelo livro “Nascido para Correr”, do estadunidense Christopher McDougall, as marcas suavam para trocar amortecimento por leveza e flexibilidade. Juntar as duas coisas ficaria para o futuro.
Em seu livro, McDougall apresentava a corrida natural dos tarahumaras, ou rarámuris (algo como “de pés ligeiros”), habitantes da fronteira escarpada do México com os Estados Unidos. Eles calçam uma sandália rústica para proteger os pés em suas intermináveis corridas, utilizadas como modal de transporte.
Ao mesmo tempo, o autor inferia que as lesões na corrida se deviam ao amortecimento excessivo dos tênis, indutor do enfraquecimento da musculatura do pé.
McDougall concluiu que corria bem e não se machucava quem quase nada levava aos pés, apenas uma proteção para a pele.
A história do branding no futuro talvez dedique alguns parágrafos a esse tempo, já que possuía valor agregado o produto que conseguia se aproximar do calçado essencial, como as huaraches, as sandálias artesanais dos tarahumaras.
Não gosto de solados altos, e é virtualmente impossível hoje encontrar algum tênis que não tenha solado de pelo menos dois centímetros de altura. Meu paradigma é a primeira edição no Nike Free, sem drop, que se calçava como uma meia; não cheguei a usar o já anacrônico Five Fingers, verdadeira luva para os pés.
Mesmo com a leveza dos tênis de corrida atuais, não consigo gostar dos tamancos que a indústria nos impinge. Daí que neste domingo (28) radicalizei, decidi correr descalço, algo que fiz muito pouco antes, apenas 20 minutos pela trilha de terra do Cepeusp e muito antes, na adolescência, por alguns quilômetros numa meia maratona paulistana, quando deixei pelo caminho meu tênis Daytona apertado (ou seria um Kichute?).
Agora a conversa era outra: 10 km pela áspera pista expressa da Marginal Pinheiros, em São Paulo, cenário da prova da marca de vestuário Plié.
Talvez para dar conta da imensa carga carroçável, aquela superfície é áspera demais, algo com que não contava. Meus pés só encontravam algum alívio nos trechos pintados pontilhados, que se interrompiam rapidamente.
Sabia, contudo, que o sacrifício passaria logo se imprimisse o mesmo ritmo que devoto a provas de 10 km ou 15 km, ainda que calçado: no pau. E era para isso, aliás, que eu agora estava a correr na Marginal.
Não cabe aqui descrever o momento em que minha meia esquerda ganhou o terceiro furo e o pé direito, a bolha; vou direto para o que interessa, meu pace (ritmo médio) final: 4min37.
Comparo esse ritmo ao de duas corridas recentes, quando usei tênis de placa de carbono: na maratona de revezamento Fila, de agosto, meu melhor pace para cada um dos dois trechos de 10,5 km foi 4min40; e na meia maratona de Florianópolis, em maio, quando deitei o cabelo: 4min33.
Tênis de placa, como se sabe, é vendido como abracadabra para o amador que se imagina Usain Bolt. Ele oferece o que a indústria chama de responsividade, mais força de deslocamento no momento em que o pé toca o solo.
Não recomendo a ninguém correr descalço, mas, caso a ideia seja economizar algumas centenas de reais sem grande perda de velocidade, este domingo mostrou que as sandálias tarahumaras, ou algo que as valha, já estão de bom tamanho.
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